[Representação Discente] Nota de balanço do questionário aos discentes do PPGLit

10/06/2020 10:19

 

Prezades colegas do PPGLit,

A representação discente apresenta um balanço do questionário que fizemos para os discentes do Programa, visando a conhecermos, minimamente, as suas condições neste momento de pandemia. Procuramos, por esse meio, fundamentos para os debates acerca do andamento de nossas atividades acadêmicas, principalmente no que diz respeito a uma eventual implementação emergencial de atividades pedagógicas não presenciais, implementação que, como sabemos, vem sendo considerada pelos órgãos administrativos da UFSC. Fez-se necessário, portanto, perguntarmos aos colegas se esta alternativa lhes é válida e mesmo possível. Entre os dias 12/05 e 02/06, 111 discentes responderam. Ressalte-se que essa iniciativa partiu de nós, representação discente, gestão “Kamiquase”, e foi enviada a todos pela secretaria do programa no e-mail com o assunto [De: Representação discente]Mapeamento dos discentes PPGLit.

A respeito dos dados das respostas objetivas (cujos gráficos copiamos abaixo), é notável que, instados a responder sobre a validade ou não de encontros virtuais a fim de dar prosseguimento ao calendário 2020.1, a maior parte das respostas foi positiva (55% = 61 discentes). Porém, enquanto 88,3% (98 discentes) disse ter infraestrutura técnica para a realização dessas atividades, uma expressiva porcentagem (11,7% = 13 discentes) disse não dispor dela. Salientamos também que 28,8% (23 discentes) respondeu que não possui um ambiente doméstico adequado para a realização desse tipo de atividade. E quanto à proposta feita pelo Fórum das pós-graduações em Letras do CCE, de realização dos dois semestres em concomitância, a maioria não concordou (51,4% = 55 discentes). A última questão se refere àqueles que não têm bolsa. Somente 46 discentes responderam e, dentre eles, 60,9% (28 discentes) disseram não ter condições de manter aulas mesmo que à distância. Abaixo, os gráficos:

É importante notar o fato de o questionário haver sido respondido por apenas 111 discentes, dos 190 matriculados no Programa (cf. quantitativos do site da secretaria). Isto nos leva a pensar que, entre os 79 discentes que não responderam, talvez haja casos de falta de condições materiais para tal (por exemplo: problemas de conexão à internet, sobrecarga de trabalho e falta de tempo) ou mesmo de condições psicológicas. Aliás, no que toca à saúde psíquica dos nossos colegas em meio ao desastroso cenário atual, o questionário não indagou diretamente pelo aspecto emocional/afetivo dos discentes durante a pandemia, aspecto fundamental para qualquer atividade, porém extremamente difícil de ser examinado por este meio. Deixamos, porém, um campo aberto para que os discentes se expressassem livremente e, aí, apareceram falas que, confrontadas com os números dos gráficos, possibilitam reflexões mais complexas.

Por exemplo, exatamente em relação à saúde psíquica, pode-se ressaltar entre os comentários, por parte de alguns discentes, o entendimento de que a pandemia não prejudicou o trabalho acadêmico de modo isolado, mas em conjunto com outros aspectos da vida. Por um lado, o contexto do surto pandêmico diminuiu as chances de conseguir emprego. Por outro, aqueles que o têm, trabalham mais para garanti-lo, aumentando exaustivamente as tarefas no infelizmente famoso “home office”, o que deriva em esgotamento mental e, consequentemente, em baixa produtividade acadêmica.

Os relatos que demonstram essa implicação mútua entre condição material e saúde psíquica, que se reflete no trabalho acadêmico, ajudam-nos a entender por que a grande maioria dos estudantes sem bolsa do Programa afirmaram não se ver em condições de manter atividades letivas, mesmo que à distância. E, acerca deste dado dos não bolsistas e para além dos relatos registrados, podemos também especular, por exemplo, que, com o RU fechado, aumenta o gasto com alimentação, o que provavelmente resulta em aumento da carga de trabalho necessária para suprir tal gasto. A essa acrescida carga de trabalho pelo dinheiro, somam-se tarefas que antes eram socializadas, como precisamente a do RU, e, ainda, os cuidados domésticos contra o vírus. Em suma, para além da demanda acadêmica não remunerada somada ao trabalho para o sustento (o que já é alta carga de energia dispendida), com a pandemia surgem outras demandas, dificultando muito ou mesmo inviabilizando a participação destes colegas em aulas.

Sobre a dificuldade desta participação atualmente, podemos supor que ela não se restrinja aos não bolsistas, considerando por exemplo o relato de um discente sobre estudantes que tiveram que viajar para as suas cidades natais para auxiliar seus familiares, cuidando dos pais, dos sobrinhos, da casa. Como esses estudantes irão participar de atividades remotas, sejam elas em horários específicos ou não? – pergunta o discente. Ou seja, tendo em vista que no momento todo o conjunto de atividades dos estudantes está afetado, o retorno às atividades letivas de modo remoto não implicaria apenas a necessidade de a UFSC prover a infraestrutura técnica para tal, mas também a atenção a outras questões ainda mais complexas.

Provimento de infraestrutura que, aliás, foi nos comentários livres largamente apontado como condicionante para tais atividades, no caso de virem a ser implementadas. Percebemos uma grande preocupação da maioria dos discentes com xs colegas e a afirmação da necessidade de que todos, sem exceção, tenham qualidade no acesso aos conteúdos, cabendo ao Programa e à Universidade investigar e disponibilizar, aos que necessitam, todo o apoio necessário, além de computadores e internet com pacote de dados suficiente. Ainda quanto a este aspecto técnico, muitos ponderaram que, embora possuam alguma infraestrutura para as atividades remotas, ela não é adequada, uma vez que, por exemplo, a internet é compartilhada com outros membros e residências, o que leva à oscilação do sinal. Mas não é apenas este aspecto que preocupa os discentes em relação a essa possível transformação em suas atividades letivas. Houve quem notou que a riqueza da Pós estaria em parte nas discussões dos encontros presenciais, o que se perderia. E, mesmo entre aqueles que aceitariam as eventuais atividades à distância, há, majoritariamente, a ressalva de que estas não podem ser implementadas apressadamente, considerando: o devido período de capacitação dos professores e estudantes para tal; o período de reajuste didático; e o debate amplo com todos os interessados, de modo que todos tenham as mesmas condições de acesso ao ensino que lhes é devido.

Registramos com ênfase esta manifestação de solidariedade por parte da maioria de nossos colegas, muito embora também seja verdade que alguns discentes defenderam incondicionalmente a implementação das atividades remotas, vendo nelas a alternativa talvez necessária para minimizar as perdas acadêmicas durante esse período sem parâmetro histórico recente, mas sem expressar preocupação com as possíveis situações de dificuldade em que seus colegas talvez se encontrem, justamente neste momento de aguda crise global.

Em relação à proposta de realização concomitante dos semestres 2020.1 e 2020.2, os números expressaram o desacordo majoritário dos discentes do Programa. Nos comentários abertos, os argumentos contra tal proposta se resumem aos prejuízos pedagógicos que dela derivariam, seja pelo excesso de leituras sem o devido tempo para a reflexão, seja pela sobrecarga tanto aos docentes quanto aos discentes, entre os quais, como já sublinhado, muitos acumulam outro trabalho ao acadêmico.

Há que se notar ainda que, para além do prejuízo nas atividades letivas, os comentários apontam o fato de que a pandemia afeta a pesquisa dos pós-graduandos de um modo mais amplo, tendo em vista: o fechamento de bibliotecas, museus e outras instituições que possibilitam a investigação, prejuízo ao que a falta de dinheiro novamente se soma, por impossibilitar a compra dos materiais necessários; a suspensão dos eventos acadêmicos; a atenção ao trabalho prejudicada pelo isolamento doméstico com familiares e às vezes com crianças, que têm as suas mais diversas demandas.

Foram várias as sugestões de enfrentamento às dificuldades por que passamos, nós pós-graduandos, neste momento. Desde modelos para atividades letivas remotas até a suspensão ou cancelamento do semestre 2020.1. No meio dessas alternativas aparecem, também, as condicionantes para a eventual implementação das atividades à distância, como já fora apontado; a sugestão de remanejamento do semestre 2020.1 para o semestre seguinte ou mesmo de 2020 para 2021; e a sugestão de prorrogação, pelo tempo de duração da pandemia, de todos os prazos acadêmicos, inclusive o de conclusão de curso, considerando os já mencionados prejuízos a todo o conjunto de atividades dos pós-graduandos.

Quanto à contraposição entre a implementação das atividades remotas e o cancelamento do semestre, vale sublinhar dois pontos que foram levantados nos comentários. O primeiro é a preocupação de que, na atual conjuntura nacional, ao aceitarmos as aulas remotas, mesmo que seja como medida emergencial e mesmo que garantindo o acesso a todos, possamos contribuir para o fortalecimento do discurso pela EAD, para a implementação deste método de ensino como regra e, consequentemente, para o sucateamento da Universidade Pública. O segundo ponto se refere à necessidade de sabermos o que está em jogo no cancelamento do semestre, como isso afetaria os colegas e todos os membros do corpo acadêmico. De fato, a Representação discente entende que a Reitoria da UFSC ainda não informou à comunidade, detalhadamente e com os devidos fundamentos legais, como é necessário, quais as efetivas consequências de um eventual cancelamento ou uma suspensão do semestre. Solicitamos, portanto, à Coordenação do PPGLit e à APG que exijam enfaticamente, da Reitoria, uma resposta adequada e amplamente divulgada, sem a qual todo o debate acerca do andamento das atividades da UFSC fica prejudicado.

Por fim, manifestamos nossa preocupação com relação ao mapeamento proposto pela Câmara de Pós-Graduação (CPG), que ofereceu um instrumento insuficiente para mapear os discentes. Fica claro que existe uma movimentação na UFSC com o intuito de “enfiar goela abaixo” o ensino remoto, ignorando as questões que vêm sendo discutidas. Posicionamo-nos vivamente contra esse tipo de imposição e faremos o possível para fazer valer o princípio da equidade no acesso e permanência na nossa universidade.

Estamos juntos nessa luta!

KAMIQUASE
Representação discente do Programa de Pós-Graduação em Literatura da Universidade Federal de Santa Catarina (PPGLit/UFSC)