Lançamento do Livro: Às vezes dá vontade de chorar feito criança – Os diários de guerra de 1943 a 1945 de Heinrich Böll tradução Maria Aparecida Barbosa

22/05/2023 23:30

Às vezes dá vontade de chorar feito criança – Os diários de guerra de 1943 a 1945

Qual pode ser a experiência de um homem de saúde frágil diante da brutalidade cotidiana da frente de batalha? E se esse homem for também um intelectual profundamente católico e pacifista, mas a serviço do exército de Adolf Hitler? São perguntas que encontram respostas nos escritos que integram Às vezes dá vontade de chorar feito criança – Os diários de guerra 1943-1945, volume que se estrutura em torno das anotações abreviadas feitas por Heinrich Böll em trincheiras e hospitais enquanto cumpria seu dever militar nos fronts da Europa. A tradução é de Maria Aparecida Barbosa.

Os diários se tornaram livro – publicado em 2017 na Alemanha – graças ao trabalho de organização do filho do escritor, René Böll, autor do prefácio e do posfácio da edição. Ele recebeu as cadernetas do pai, pouco antes de sua morte, não para que fossem publicadas, mas para que pudessem se converter em fontes de pesquisa. A família, contudo, percebeu uma oportunidade que talvez tivesse escapado a Heinrich Böll. “Queríamos preservar esses diários como um documento para a posteridade, torná-los disponíveis num mundo ainda dominado por guerras”, justifica René no prefácio.

A experiência de Böll muitas vezes incorpora atividades da vida civil, como ler livros e ir ao cinema, ou construir amizades com outros soldados, em rodas de bebida e tabaco. O usual na rotina cruel da guerra, no entanto, é sentir uma fome devastadora, ter o sangue sugado impiedosamente por piolhos, ser atingido por estilhaços e sofrer dores incessantes. Pior ainda são as aflições da mente e do coração, nas invocações frequentes a Deus e nas manifestações de saudade alucinante da esposa, Annemarie. As anotações nos diários às vezes parecem poemas trágicos, como essa de 20 de novembro de 1943: “A noite terrivelmente/fria e miserável/no front cavando trincheira//De manhã bombardeio,/o pior até agora/o ‘órgão de Stálin’”.

Böll sentiu na pele as duras transformações da Alemanha no século xx. Nascido em Colônia, foi convocado para o Exército em 1938. De volta a sua cidade depois da guerra, começou a publicar regularmente a partir de 1947. Retrato de grupo com uma dama (1971), um panorama da Alemanha da Segunda Guerra até os anos 1970, foi citado como o livro que coroou sua carreira no texto que justificou seu prêmio Nobel. O romance mais conhecido do escritor, A honra perdida de Katharina Blum (1974), saiu pela CARAMBAIA.

Ao lado de Günter Grass (Nobel de literatura de 1999), Böll é tido como um dos grandes nomes da literatura alemã do pós-guerra. Ambos publicaram seus primeiros livros entre o fim dos anos 1940 e início dos 1950, em reação à produção literária da época, marcada por certa condescendência com o passado nazista. As obras da nova leva de escritores abrangiam desde a sobrevivência das ruínas do pós-guerra até o acompanhamento gradual do “milagre” econômico do período de reconstrução do país, com todas as suas mudanças de valores e crises morais.

Böll, em particular, adotou uma abordagem e um estilo realistas, ainda que embebidos de ironia. Com Grass e outros nomes respeitados, como Martin Walser e Hans Magnus Enzensberger, integrou o Grupo 47, uma associação de escritores que decidiram lutar por uma sociedade pacífica, democrática, socialmente justa e guardiã da liberdade de expressão.

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SOBRE A EDIÇÃO

A edição reproduz no tamanho original as três cadernetas deixadas pelo futuro escritor, que ganharia o prêmio Nobel de Literatura em 1972, e abaixo delas as transcrições de sua nervosa caligrafia. O projeto gráfico de Laura Lotufo se utiliza de diversos recursos visuais para montar uma rede de informações que esclarecem ou complementam as notas originais, por meio de trechos de cartas, dados técnicos, obras futuras de Böll e relatórios do Exército. 

A tradução para o Português exigiu extensa pesquisa em 2021 da Profa. Dra. Maria Aparecida Barbosa, colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Literatura da Universidade Federal de Santa Catarina.

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