LUTO

02/10/2017 19:32

Prezados e prezadas,

Tendo em vista o acontecimento lamentável ocorrido na manhã desta 2ª feira com o Magnífico Reitor da UFSC, Luiz Carlos Cancellier de Olivo, encaminho o Memorando Circular nº 20/2017/GR, e informo que está decretado o luto oficial de três dias (restante da segunda-feira mais os dias de terça-feira, quarta-feira e quinta-feira).

Os recursos aos indeferimentos das inscrições para o Processo Seletivo 2018 serão apurados após o retorno das atividades e publicados na próxima 6ª feira, dia 06 de outubro de 2017.

Memorando-Circular-nº-20.2017.GR_

SEMINÁRIO “FIGURAS DE LA VOZ EN LA POESÍA LATINOAMERICANA CONTEMPORÁNEA”

29/09/2017 14:21

 

Gostaríamos de convida-los a participar do Seminário e Evento de Extensão que acontecerá na próxima semana, intitulado “Figuras de la voz en la poesía latinoamericana contemporánea”. Este será ministrado pelos Professores Argentinos: Irina Garbatzky (Universidade Nacional de Rosário), Ana Porrúa (Universidad Nacional de Mar del Plata), Ignacio Iriarte (Universidad Nacional de Mar del Plata) e Matías Moscardi (Universidad Nacional de Mar del Plata). O evento acontecerá nos dias 4, 5, 6 e 9 de outubro, no período matutino e vespertino.

 

Em anexo, segue cartaz convidativo com maiores informações e o cronograma das atividades. Para aqueles que participarão, peço que me respondam este e-mail solicitando os materiais que serão estudados no Seminário, que compartilharei a pasta do Dropbox.

 

Para realizar sua inscrição basta acessar o link: http://hoje.unisul.br/eventos/seminario-figuras-da-voz-na-poesia-latinoamericana-contemporanea/

Os certificados serão disponibilizados no final do curso.

EXISTE, LOGO ESCREVE” PROPÕE A LITERATURA COMO ABERTURA AO INUMANO

18/09/2017 14:31

Ao escrever Existe, logo escreve – o inumano na arte-literatura, a jornalista, professora, ensaísta e escritora Raquel Wandelli aponta a literatura como um lugar onde a humanidade problematiza e transgride sua incapacidade de comunicação com o mundo e com os outros seres. No paradoxo de ser o instrumento que marca a fratura entre letrados e iletrados, a literatura é também a grande fábula de cura dessa ferida profunda, o lugar privilegiado onde o humano pode se comunicar com os animais, os objetos, as plantas. Pode vencer o silêncio ou a mudez que ele próprio impôs ao mundo e ao seu próprio semelhante. De saída, a obra se propõe a pensar a filosofia e as artes como laboratório para o combate à ideologia maior, da qual se originam todas as formas de opressão do homem contra as outras espécies ou do homem contra ele mesmo, o antropocentrismo.

“Ver, pensar e escrever o outro inumano é postular um pensamento em crise, no qual o homem não é mais a origem e o fim”, propõe a obra desde a sua introdução, acrescentando que essa crise é da ordem fundante da história, da cultura e da ontologia narcísica de uma espécie que se autodeclarou superior às outras. Se o humano é muito mais do que ele mesmo, a arte se faz vida quando o artista perde a posição solar e se lança para o “ser selvagem” de sua existência. A autora mostra como a literatura destrona o homem do centro do universo, mas recusa a premissa de que o escritor dá voz aos anônimos ou aos seres emudecidos. Com ela compreendemos que são antes as existências politicamente minoritárias que dão voz ao escritor, se a gente considera com ela e seus autores que a maioridade dominante no mundo não tem o que dizer.

Publicado pela Editora da Universidade Regional de Blumenau (Edifurb), Existe, logo escreve será lançado no dia 21 de setembro, às 19 horas, na Fundação Cultural Badesc, em noite de autógrafos com fundo musical da Banda Felixfônica, de Guilherme Gouvêa e recital de passagens do livro. A obra se desenrola como um ensaio de rigor teórico e de teor fiolosófico, ético e literário, mas mantém do início ao fim uma escritura de acabamento poético. A edição marca o trigésimo ano de fundação da Editora, dirigida pelo escritor e professor de literatura Maicon Tenfen. Escrever é inumano, afirma a autora, “é percorrer linhas que escapam e transbordam para todos os lados”.

O livro explora a potência inumana e impessoal da literatura, pela qual o escritor pode devir ou se tornar qualquer coisa, qualquer ser, menos ele mesmo. Esse conceito desenvolvido pelo filósofo Gilles Deleuze em Crítica e clínica norteia a construção da categoria do “narrador-coruja”, inspirada na figura do escritor-repórter errante e observador das sombras da cidade que Baudelaire chamou de flâneur. A autora traça um fio condutor entre o que caracteriza como “narrativas do escuro contemporâneo” dentro da chamada literatura da realidade, na qual o jornalismo nasce desde sempre inseparável da arte narrativa.

Ao enfocar o sentido da visão, a autora faz uma exaustiva cartografia por uma rede de narradores de diferentes épocas capazes de enxergar aquilo que o olhar humano domesticado não vê. Passeia por Edgar Alan Poe, Baudelaire, Walter Benjamin, Fernando Pessoa, João do Rio, Clarice Lispector, Franz Kafka, Guimarães Rosa, Günther Walraff, Hunter Thompson, Mário de Andrade, Gay Talese, Eliane Brum, Rodrigo de Haro, o fotógrafo Antoine D’Agata, entre muitos outros, procurando o traço comum e singular de cada um. “Desde que Restif de La Bretonne propôs em Paris, nas vésperas da Revolução Francesa, a associação entre um repórter e uma ave noturna, essa literatura e esse jornalismo ouvem o chamado do não-contado e do proscrito nas zonas de sombra das cidades”. Entra em ação a coruja, um animal sonâmbulo, observador noctambulista e vigilante como emblema e método do narrador andarilho, ela própria “um quase-invisível”. A coruja é capaz de enxergar, com sua cabeça pivotante, aquilo que a maioria dos passantes não quer ver. Ver é viver, ou como escreve a autora, “quem flana pelas ruas e viaja pelo mundo tende a reconhecer o rosto dos povos”.

Embora concentrada num único volume de 364 páginas, ilustradas com alguns desenhos, gravuras e fotografias, a obra é, na verdade, uma trilogia abrigada sob o manto “Ver, pensar e escrever com(o) um animal”, que intitula os três livros do conjunto. Cada parte enfatiza uma dessas diferentes dimensões da percepção ou do gesto do artista. Com essa forma de organização da obra, a autora realça os múltiplos funcionamentos dos modos de frase que afetam e interrogam a sua pesquisa do inumano, “ora enfatizando o ver, ora o pensar, ora o escrever, mas sempre acentuando a zona de indiscernibilidade entre eles”.

Sob o emblema da coruja, o primeiro livro realiza uma vasta cartografia dos “narradores noturnos” focada na poética de visão que Raquel abstrai do “método coruja”. E também do “modo vaga-lume”, em alusão à imagem proposta por Didi-Hubermann para configurar, na obra do cineasta Pier Paolo Pasolini, um narrador de luzes delicadas, que busca a imagem sobrevivente dos povos em desaparecimento. O devir-animal é acionado pela “potência inumana e impessoal da flânerie”, capaz de desencadear essa visão horizontal e múltipla do narrador que, caminhando a esmo em busca do desconhecido, suspende o olhar centrado no eu para ver o mundo dentro de si. Coruja, lobisomen, vaga-lume: todos esses traços de animal “encorporados” à escritura buscam devolver ao olhar humano a acuidade que ele perdeu. Eles correspondem, segundo Raquel, ao ímpeto da escrita de desvelar-se para as infinitas pequenezas e minoridades do mundo que não são dadas a ver.

O segundo livro (ou segunda parte) dedica-se ao modo de pensar não-antropocêntrico da literatura, começando por abordar o estranhamento não como técnica ou efeito, mas como a condição fundante da arte, que a liberta da familiarização e banalização do mundo pela palavra. Busca em experiências artísticas extra-ocidentais e em teorias não-empobrecidas pelo racionalismo cartesiano uma feliz confluência entre filosofia, literatura e o pensamento ameríndio, no qual a perspectiva do eu e do outro entram em constante troca e transformação. Como na mitologia indígena, a arte está mergulhada na premissa de que tudo no mundo implica um ponto de vista ou “tudo que existe é bom para pensar”, segundo a máxima de Lévi-Strauss. Explorando a sintaxe do mar como método de pensamento na obra de Clarice Lispector, Raquel costura um profícuo diálogo entre a literatura, o perspectivismo ameríndio e o esculturismo africano. Aborda não só os contos e romances mais comentados da escritora, como Água Viva e A hora da estrela, mas também os textos menos visitados, a exemplo de “A menor mulher do mundo” e Assim nasceram as estrelas, no qual a escritora reconta para crianças episódios da mitologia indígena brasileira.

Finalmente no terceiro livro, focado no escrever, Raquel se inspira na sintaxe de vida do escaravelho-barata, evocado por Clarice em Paixão segundo G.H., como emblema da escritura. Nessa última parte, faz uma viagem de vasta erudição por inúmeros poetas e narradores na qual o animal aparece não apenas como metáfora, mas como método de vida e de escrita para concluir que toda existência no mundo é, em última análise, uma biografia que se conta, em referência à ideia do animal autobiográfico de Jacques Derrida. Ou para lembrar Francis Ponge, outra fonte importante do ensaio, tudo que existe além do homem é uma forma de escritura. O capítulo “Morre o autor, nasce a barata” analisa o acontecimento da morte simbólica do autor não só como condição de surgimento da leitura, mas como espaço de abertura para o devir-inumano.

A potência inumana da escritura é compreendida a partir do desencadeamento de devires minoritários que levam o escritor a tornar-se mulher, criança, índio, negro, animal, sempre na direção do menor, do que não foi ainda inventado, nunca na direção do dominante, como analisam os filósofos Deleuze e Guatarri, dois dos muitos teóricos basilares no pensamento da autora. Discute com personalidade o tema do “embate entre a máquina de poder e a máquina literária”, alimentado pela luta entre a doença da dominação, que é um delírio de morte, contra a saúde da resistência, que é um delírio de vida, segundo a célebre distinção de Deleuze.

Esse embate aparece de modo muito eloquente e criativo na análise de “Estado de graça”, texto inclassificável de Clarice Lispector para o Jornal do Brasil, que insinua a oposição radical entre o horror do estado de exceção exercido pela Ditadura Militar e o estado de graça, ensinado ao homem pelos animais, que conhecem melhor do que ele o prazer de estar vivo ou, no dizer de Clarice, a “graça de viver”. Uma questão ética e política atravessa toda a literatura na percepção do inumano: “A relação de embate entre a máquina antropocêntrica e a máquina de guerra da escrita, destruidora de todas as hierarquias e separações entre os viventes”, como sublinha a autora.

Existe, logo escreve é prefaciado pela professora e PHD em educação, Gilka Girardello, que se refere à Raquel como “uma escritora-xamã de pensamento vertiginoso”, reconhecendo-a no termo que a própria autora atribui a Clarice Lispector. Ela enaltece a fértil interlocução que a obra realiza entre Clarice e o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro. “É muito feliz a ida da autora às lendas indígenas, contadas por Clarice à luz do pensamento do antropólogo, que resulta em uma crítica acachapante à cultura ocidental vencedora”. Especialista na temática da infância, Gilka chama a atenção para a ousadia e a coragem da autora, ressaltando a “defesa originalíssima que Raquel faz de uma humanidade fundada em uma comunicação radicalmente alteritária”. O prefácio respalda a reflexão que o livro traz: “Se a humanidade dos seres se localiza na relação de uns com os outros, todas as espécies, todas as criaturas passam a fazer parte da infinita pluralidade humana”. Reforça ainda a crítica contundente que a autora expressa contra o senso comum e o vazio perverso do jornalismo comercial contemporâneo, que se afasta cada vez mais dos povos que palpitam no escuro do contemporâneo para se deixar cada vez mais aparelhar pelo poder.

Sempre se valendo do diálogo crítico e criativo com muitos escritores e teóricos, mas evidenciando seu percurso marcadamente autoral, como acentua Gilka, o livro se direciona para um encadeamento do olhar, do pensamento e da gramática do inumano. “Escrever o inumano não é escrever sobre animais, mas fazer operar na escrita um animal”. Afinal, alerta a autora, “um escritor não escreve para leitores previsíveis que vão se reconhecer no espelho da leitura”. A tese do livro é clara: “São os animais que carregam o poeta”, e não o contrário. Desde que o homem escreve o animal e se inscreve nele, “dá a ler uma ordem do fascínio, do medo e da violência, num jogo contraditório entre dominação e encantamento”.

Os papeis sociais exigem das pessoas um porvir definido, enquanto as artes o libertam para o seu devir ou para a sua potência de metamorfoses, nos diz Raquel: “A literatura cruza tudo que escapa à definição solar, tudo que dificulta o fechamento, tudo que é marcado por um devir instável”. Nesse sentido, a escritora propõe a literatura como uma invenção capaz de “libertar a máquina do imaginário do paradigma do homem como figura de supremacia na cultura ocidental: o homem em oposição à mulher e, por diferimento, o homem em oposição ao negro, ao índio, à criança e, finalmente, em oposição ao animal, o completamente outro”. Artífice de uma escrita de acabamento estético e de agudeza ética, ela conclui: “Escrever o inumano é convocar um autor que escreve rasgando a sintaxe como um animal, cavando um mundo dentro de outro, como o carrapato rasga sua sintaxe de vida no território corpóreo do boi”.

O que Raquel Wandelli escreve não lhe pertence, na retórica da própria autora. Em Existe, logo escreve, a pesquisadora adota uma escrita hipertextual no “princípio mais radical e concreto do conceito”. O que isso quer dizer? “Significa não apenas se remeter a outros textos, como um conjunto de nós e links, mas efetivar um apagamento da propriedade autoral em favor da instauração de uma escrileitura realmente coletiva”. Quanto mais a autora investe e acredita nesse aspecto impessoal da escrita, mais a singularidade multifacetada do seu livre-pensar e do seu livre-escrever se lapida, como um diamante, nas palavras de Gilka. “É sempre de Raquel a voz que nos acolhe e conduz, fazendo com que uma leitura tão densa seja refrescante como um galope nas campinas, mesmo quando seja terrível o que se pressente além delas”.

Pequena biografia de uma “escritora-xamã”
Natural de Florianópolis, Raquel Wandelli atua como professora do Curso de Jornalismo da Unisul há quase 20 anos. Especialista em Estudos Culturais, é mestre em Literatura, com a dissertação A reconstituição do corpo-livro nas narrativas hipertextuais, que aborda de modo pioneiro o conceito de hipertexto em narrativas de formato impresso. De sua autoria publicou Leituras do hipertexto: viagem ao Dicionário Kazar, coedição entre a Editora da UFSC e a IOESP (2004), uma das obras mais consultadas do país em relação a um modo de escrita expansível, que desorganiza a ordem linear da narrativa com a lógica da conectividade e que, antes da invenção da internet, já fazia parte de célebres experiências literárias em papel. Doutora também em Literatura, defendeu em 2014 a tese Ver, pensar e escrever com(o) um animal; devires do inumano na arte-literatura, que analisa abertura ao inumano pela escrita. Entendida pelos filósofos François Lyotard e Gilles Deleuze como a experiência do ser anterior ao processo de hominização, a inumanidade é um estado de múltiplas possibilidades de devir que permanece na vida adulta, feito uma camada oculta ou obliterada. Assim, o vir-a-ser animal, criança, mulher, selvagem, e tudo o que desvia do modelo solar de homem, reprimido para que a pessoa possa atuar dentro do padrão humanista, escapa em algumas esferas, como a infância, a loucura, a filosofia ou as artes.
Jornalista concursada do INSS, foi assessora de comunicação da Secretaria de Estado da Educação e também da área de Cultura na UFSC. Integrante atual do Coletivo de Mídia Jornalistas Livres, trabalhou em jornais diários de Santa Catarina, incluindo O Estado, A Notícia e Jornal de Santa Catarina. Autora de inúmeros artigos em livros, revistas e publicações acadêmicas sobre cinema, literatura, filosofia estética, cultura e comunicação, também incursiona no campo da ficção. Conquistou diversos prêmios de contos, poesia, crônica e conto publicados em revistas e livros diversos.

Resultado de pesquisas no doutorado do Curso de Pós-Graduação em Literatura da UFSC, complementadas no Centro de Estudos de Literatura Comparada da Université de Paris 3 (Sorbonne Nouvelle) e no Projet Animot da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais, em Paris, o livro é também fruto das reflexões sobre sua prática no ensino de jornalismo. Em quase duas décadas de magistério na Unisul, realizou dezenas de projetos de vivência com os alunos em coletivos que lutam pela sobrevivência, nominados por ela como povos de resistência. Moradores de rua, comunidades rurais, urbanas e tradicionais que preservam modos de vida singulares, ocupações de sem-teto ou sem terras, comunidades alternativas, usuários de drogas, povos do mar, povos encarcerados, povos dos manicômios judiciários, idosos em casas de acolhimento, quilombolas, adolescentes em conflito com a lei ou com perda de vínculo familiar, sobreviventes do holocausto hanseniano. Todos esses coletivos minoritários que compartilham uma luta em comum e não correspondem a um conceito geográfico de povo são abraçados pelo projeto que ela chama de “Jornalismo de Povos”. A tarefa dessa literatura da realidade é, para a escritora, trazer de volta temas e povos que desaparecem para os livros e para os jornais.

CARTOGRAFRIAS DO CONTEMPORÂNEO: VONTADES DE VERDADE E PROCESSOS DE SUBJETIVAÇÃO A PARTIR DE MICHEL FOUCAULT.

18/09/2017 14:29

As contribuições de Michel Foucault para o campo de estudos da Análise do Discurso (doravante AD) vêm conquistando cada vez mais pesquisadores, o que demonstra a proficuidade do pensamento foucaultiano aos estudos discursivos, oriundos dos postulados da AD francesa. Ao acionar os conceitos propostos pelo filósofo, os pesquisadores criam um campo específico de análise de diferentes objetos, textuais e/ou imagéticos, nos quais se percebe a emergência de dados discursos, sua inscrição na história, sua articulação com os jogos poder/saber e o modo como atuam na produção de subjetividades. Nessas pesquisas, busca-se entender o funcionamento do discurso, que não é inteiramente linguístico e nem simplesmente gramatical, e tomam o conceito de en unciado no exercício de sua função enunciativa como matriz metodológica de análise das discursividades, seja em uma dimensão arqueológica, genealógica ou de uma ética/estética da existência. Essa divisão não se faz de forma estanque; pois, em um mesmo estudo, conceitos dessas chamadas “fases do pensamento foucaultiano” podem atuar simultaneamente, dependendo do enfoque adotado ou da natureza do objeto de análise que solicita, do pesquisador, “uma conversão do olhar” frente às materialidades em estudo. Há um conjunto de conceitos e/ou noções operatórias que, em tese, se preocupam com a análise das discursividades (sua emergência, campo associativo, relações de poder, dispositivos e produção de subjetividade) nos domínios da linguagem e articulados ao estudo daquilo que foi efetivamente produzido, correlacionado ao que se dizia e se fazia em determinada singularidade histórica.

O Laboratório de estudos discursivos foucautianos de Catalão (LEF-GO) realizará o I Seminário “Cartografias do contemporâneo: vontades de verdade e processos de subjetivação a partir de Michel Foucault”, no período de 27 a 29 de novembro, com o objetivo de problematizar discursos e/ou temas contemporâneos a partir do pensamento de Michel Foucault. Os estudos desse filósofo oferecem, aos leitores e pesquisadores, perspectivas promissoras para se refletir sobre questões contemporâneas, uma vez que suas pesquisas não ficaram datadas no tempo e nem fixadas apenas nos objetos sobre os quais Foucault se debruçou. Outro aspecto a ser destacado são os cursos ministrados pelo filósofo no Collège de France, cujas public ações e traduções ainda estão em curso. Nesses trabalhos, sobretudo nas partes introdutórias e em outros textos de sua vasta obra, o referido autor esclarece que seu principal interesse de pesquisa ou caminho de investigação recaiu sobre a análise do que ele designou como “focos de experiência”, expressão indicativa de três linhas de observação dos discursos, a saber: a) “as formas de um saber possível”, b) “as matrizes normativas de comportamento para os indivíduos” e, por fim; c)  “os modos de existências virtuais para sujeitos possíveis” (FOUCAULT, 2010, p. 04-05).

Para a proposição deste colóquio, contaremos com pesquisadores de diferentes de grupos de estudos de Análise do Discurso (AD) do Brasil, cujo diálogo com a obra de Michel Foucault tem sido intensos.  Nosso objetivo gira em torno do eixo temático no qual se inscreve os objetivos desse evento, a saber: quais contribuições dos postulados foucaultianos para análise e problematização de temas e/ou discursividades contemporâneas?

Aproveitando a via aberta pelo italiano Giorgio Agamben (2009), entendemos que ser contemporâneo de seu próprio tempo é adotar um ponto de vista que não se fixa ou se prende na sua própria época, mas dela toma distância. Teríamos um processo de adesão e distanciamento: ter a dimensão do seu tempo e dele se distanciar para que possa apreendê-lo.  Em outros termos, contemporâneo é todo aquele “consegue ver não somente as luzes do seu tempo, mas o escuro, o obscuro sob o excesso de luz”. Nessa linha de observação proposta por Agamben, podemos inferir que para a análise do contemporâneo, no qual distintas temporalidades históricas se cruzam, ser contemporâneo é não se de ixar cegar pelas evidências (luzes) de seu tempo, mas ser capaz de “olhar de fora” para apreender as temporalidades que atravessam essa mesma historicidade. Trata-se de um modo de pesquisa desenvolvido por Foucault, o qual é citado pelo italiano, quando se refere a forma como o teórico analisou e pesquisou arquivos de diferentes registros históricos do passado (loucura, medicina, prisão, sexualidade etc.) com o objetivo de entender o presente ou aquilo que nos faz ser o que somos.

Acreditamos que esse modo de observação das discursividades contemporâneas deve-se vincular ao duplo processo indicado por Agamben, quando menciona a necessidade de manter o olhar fixo no seu tempo e dele se distanciar, não para enxergar as luzes, mas o obscuro que se mistura ao excesso de luz. Nesse movimento requerido, esse olhar de fora, distanciado, possibilita que se apreenda as diferentes temporalidades que se inscrevem nos discursos da atualidade. Tal procedimento dialoga com o que Foucault designou como “conversão do olhar”, quando, em “Arqueologia do Saber”, explicitou os caminhos de análise do enunciado e da função enunciativa. Essa problematização analítica requer do pesquisador “uma conversão do olhar”, pois os discursos se enredam em en unciados que não estão ocultos e nem totalmente visíveis, ou, às vezes, já estão tão entranhados no social que não o identificamos. Essa conversão do olhar recai justamente sobre a necessidade de apreender os discursos e analisá-los em sua singularidade. Essa postura interpretativa implica que a emergência de um dado objeto, independente da materialidade que o constitui, não se separa das molduras formais (discursos, enunciados, práticas discursivas, leis, domínios de memória etc.) que chegam até nós cingindo-nos. Tal gesto analítico implica que, para apreender as discursividades contemporâneas, necessitamos de um olhar atento aos discursos efetivamente produzidos no seu tempo e dele tomar distância, observando as camadas de passado que o constituem e as evidências que os fazem passar por verdadeiros. Esse modo de analisar os discurso s, sob o prisma foucaultiano, nos mostra que as verdades são historicamente produzidas, e são gestadas por vontades de verdades coletivas e sociais, localizadas no tempo e no espaço, que se materializam em discursos e constituem os sujeitos, fazendo com que esses tenham a ilusão de falarem a partir de suas próprias convicções.

 

Serão aceitas propostas de trabalhos sobre temáticas variadas sobre aspectos da contemporaneidade, desde que façam interface com os seguintes eixos teóricos:

 

  1. a)Que se inscrevam na temática proposta pelo evento, ou seja, com a abordagem discursiva proposta por Michel Foucault;
  2. b) que realizem diálogos entre abordagem discursiva de Michel Foucault e de outros teóricos da Análise do discurso;
  3. c)Que se inscrevam em qualquer linha de análise do discurso;
  4. d)Que acionem o pensamento de Michel Foucault para análise de discursividades e/ou temáticas contemporâneas.

 

Referências:

Foucault, M. O governo de si e dos outros. São Paulo: Martins Fontes,. 2010.  p. 04-05 (curso do collége de france 1982-1983)

Agmben, Giorgio. O que é o contemporâneo? E outros ensaios. Chapecó/SC. Argos, 2009.

Programacao Geral

A Crítica Genética: da França ao Brasil

13/09/2017 14:46
Nesta quinta-feira, 14/09, às 10h30, sala 237 (CCE-A) acontecerá a conferência
A Crítica Genética: da França ao Brasil
ministrada pela Profa Dra Márcia Ivana Lima e Silva (professora titular da UFRGS).
Esse evento, promovido pelo curso de Francês (DLLE-UFSC) é gratuito e aberto a todos.

edição n.27 do Boletim de Pesquisa NELIC

06/09/2017 16:26

A equipe editorial do Boletim de Pesquisa NELIC informa que a edição de número 27 acaba de ser publicada e está disponível no portal de periódicos da UFSC:

 

https://periodicos.ufsc.br/index.php/nelic/issue/view/2550

 

Para abrir este número, contamos com “A escuta selvagem”, de Raúl Antelo, importante ensaio decorrente da aula inaugural ministrada pelo Prof. Antelo em março deste ano no Programa de Pós-graduação em Literatura da Universidade Federal de Santa Catarina.  Destacamos também a publicação do artigo “Drummond e o falso Fernando Pessoa”, de Rita de Cássia Barbosa:  apresentado em 1987 durante o evento “Lembrando Drummond” (uma homenagem a Carlos Drummond de Andrade, realizada na Universidade Federal de Santa Catarina dois meses após o falecimento poeta), o artigo manteve-se inédito nesses últimos 30 anos e, como poderá ser constatado pela leitura, mantém-se atual. Com esse resgate histórico, o Boletim se une à preparação para o evento “Poesia, memória e arquivo”, que será realizado em outubro deste ano, com a proposta de buscar nas memórias, no arquivo e na poesia, a permanência do legado de Carlos Drummond de Andrade.

 

A edição n.27 do Boletim de Pesquisa NELIC conta ainda com a colaboração de pesquisadores da UFSC e de outras instituições, com publicações que reforçam o escopo da revista na área de literatura e cultura contemporâneas, em âmbito brasileiro e latino-americano. São reflexões que revisitam a obra de autores do cenário nacional, como Mário de Andrade, Clarice Lispector, João do Rio, nos artigos de André Zacchi, Djulia Justen e Valdemar Valente Júnior, respectivamente; ou do cenário latino-americano, nas reflexões de Jorgelina Rivera acerca de Pierre Menard, de Jorge Luis Borges. A pesquisa de arquivo e o trabalho com periódicos estão presentes no artigo de Laíse Ribas Bastos, a partir da correspondência inédita de Domingos Carvalho da Silva; no trabalho de Scheyla Horst e Márcio Fernandes, que discutem alguns aspectos da reportagem literária no jornal Nicolau; e, ainda, no artigo de Joaquín Correa, sobre a revista argentina El Cielo e o trabalho editorial de Rodolfo Walsh.

Você também pode acompanhar nossos informes em:

 

https://periodicos.ufsc.br/index.php/nelic/index

http://www.nelic.ufsc.br/

https://www.facebook.com/NELIC

 

Agradecemos a divulgação e desejamos uma boa leitura!

 

Equipe Editorial Boletim de Pesquisa NELIC

 

Núcleo de Estudos Literários & Culturais

Universidade Federal de Santa Catarina

Centro de Comunicação e Expressão

http://www.nelic.ufsc.br/ (48) 3721-6602